sexta-feira, 27 de abril de 2012

Para-tarefa

Quando um grupo de pessoas se propõe realizar um trabalho ou uma tarefa; antes que todos e cada um iniciem suas partes, é necessário que se dediquem a uma atividade prévia, que é chamada pelos teóricos dos grupos operativos, com o nome de para-tarefa. A para-tarefa antecede a ação que o grupo tem como objetivo realizar. Exige tempo e dispêndio de energia. É através dela que o grupo se prepara para o que vai fazer. Sem esta preparação, ele não conseguiria as condições ideais para empreender aquilo para o qual ele foi constituído. Não é preciso ir muito longe para entender. Imagine se a tarefa a ser realizada é a de um jogo de futebol, quantas para-tarefas são necessárias para que a equipe de jogadores se encontre preparada para o enfrentamento com o adversário?... E, no caso de a tarefa ser a de uma orquestra que deve se apresentar num grande concerto... Quanto tempo e esforço são necessários para que todos, músicos e instrumentos, se ajustem e adquiram a harmonia necessária que garanta a excelência da apresentação? Através da para-tarefa, quebram-se as arestas, as diferenças de intenções, de pensamentos, de pré-conceitos, de expectativas, que podem comprometer o bom resultado das ações grupais. Através da boa execução dessa fase, os membros do grupo passam a se conhecer melhor, passam a se entender em seus pontos de vista, aprendem a confiar uns nos outros, descobrem as maneiras de se fazer mais bem entendidos, deixam-se perceber no grau de envolvimento com que se lançam ao objetivo que é comum, aprendem a se complementar na construção de suas idéias e na criatividade, ampliam o sentimento de liberdade de falarem, sem receios, sobre o que pensam e sentem. Quanto mais exigente é a tarefa a ser realizada pelo grupo, maior será também a necessidade deste se dedicar à para-tarefa, à boa afinação de cada um de seus membros com o objetivo a que se propuseram.

Por José Morelli

sexta-feira, 20 de abril de 2012

Efeito terapeutizante

Dentre os livros escritos por Carl Rogers um dos mais conhecidos intitula-se “Tornar-se Pessoa”. A esse autor é atribuída a afirmação de que “todo relacionamento autêntico é terapêutico”. Uma conversa tranquila entre amigos não possui, diretamente e em primeiro lugar, o objetivo de promover a cura psicológica daqueles que dela participam; no entanto, nada impede que, dessa conversa, resulte um efeito colateral, que promova uma certa cura, uma certa harmonização interna e externa, que ajuda na saúde da pessoa. Ao efeito assim obtido não é dado o nome de efeito terapêutico mas o de efeito terapeutizante.

Esse mesmo efeito pode ser obtido de um passeio ao ar livre, de uma caminhada, de uns dias de férias bem aproveitados, da convência diária com pessoas que se quer bem, de ouvir a uma bela música, de participar de uma dança, de uma atividade lúdica entre crianças ou adultos, de um trabalho produtivo e gratificante, da leitura de um bom livro, da criação ou reprodução de uma obra artística, de uma meditação na intimidade consigo mesmo, do assistir a um bom filme ou a um bem elaborado programa de televisão. O contato ou interação com a harmonia externa ajuda à harmonização interna.

À saúde se contrapõe a doença. Ambas fazem parte da realidade da vida. Um diálogo é mantido entre saúde e doença. As pessoas protagonizam esse diálogo constantemente. Mesmo quando parecem distraídas, entretidas pela saúde e a doença nem consegue lhes passar pela cabeça, ainda assim, o medo do adoecer está presente, não permitindo que a tranquilidade do espírito seja completa.

A vida é administrada. Administra-se a vida com tudo o que dela faz parte. Saúde e doença são como enígmas. Possuem segredos difíceis de serem desvendados. Cada pessoa lida, à sua maneira, com o que a pode levar à saúde ou à doença. Há aqueles que gostam de brincar com o perigo, gostam de desafiá-lo, parece sentirem-se vitoriosos, mais vivos e saudáveis quando conseguem superá-lo, mostrando-se mais hábeis e fortes que o perigo que os ameaça. Colocando essas questões dessa forma, talvez se poderia afirmar que a prática de esportes radicais possui, também, a capacidade de promover efeito terapeutizante naqueles que se sentem fortemente atraídos a vivenciar emoções fortes, arriscando-se e vivendo perigosamente.

Por José Morelli

quinta-feira, 12 de abril de 2012

Administrar o tempo

Sendo uma contingência da matéria, o tempo acompanha tudo o que fazemos. Mesmo os nossos pensamentos e sentimentos não acontecem sem ele e não deixam de ser condicionados por ele. Para se poder administrar o tempo é preciso certas condições de equilíbrio emocional. A ansiedade pode ser um obstáculo na realização dessa importante tarefa. A sensação de vazio e a ânsia de preenchê-lo dificultam estarmos por inteiro naquilo que temos diante de nós e que é nossa incumbência do momento presente.

A falta de organização na hora de executarmos nossas atribuições acaba aumentando nossa ansiedade. Forma-se, então, um círculo vicioso, que faz agravar cada vez mais o contexto geral em que nos inserimos.
A ansiedade pode ser devido à complexidade ou dificuldades inerentes àquelas coisas que consideramos serem nossas obrigações. Com uma justa dose de razão, ficamos com medo de não conseguir realizá-las ou de realizá-las imperfeitamente. Outras vezes, acontece de a ansiedade ser devido não a razões vindas daquilo que fazemos, mas de nós mesmos, de nossa insegurança e falta de confiança.

Para superação dessa insegurança ajuda muito fazermos uma boa administração do tempo, que deve ser precedida por um dedicado planejamento. Para realizar esse planejamento é preciso dar-se um tempo, uma parada no corre-corre da vida e do dia-a-dia, avaliar o que vem sendo feito, priorizar o que é realmente importante, destinando o tempo necessário para cada coisa e, principalmente, ter coragem de abandonar tudo aquilo que for considerado superado e improdutivo.

Se algum êxito conseguirmos no sentido de bem planejar e organizar o tempo, criamos um outro círculo vicioso (virtuoso) que, ao contrário do anterior, faz com que a situação melhore, a auto-confiança seja reforçada e a insegurança diminuída.

A ansiedade pode ter mais de uma causa. A boa administração do tempo é um fator que certamente contribuirá, por sua influência benéfica, para a descoberta de outros conflitos que possam estar causando a ansiedade.

Fim de ano é tempo de avaliar a vida. Boa oportunidade de retomá-la e orientando-a para as direções que melhor atendem aos nossos objetivos.

Por José Morelli

quinta-feira, 5 de abril de 2012

"Quebrar arestas"

As corredeiras dos rios fazem com que lascas de pedras se desprendam, carregando-as consigo. Na medida em que estas se chocam umas com as outras e com os obstáculos encontrados nas margens e nos leitos profundos ou rasos dos rios, vão pouco a pouco quebrando suas arestas, arredondando-se em suas formas. Antes de as quebrarem, essas pedras são levadas pela correnteza com mais dificuldade e lentidão, por causa do maior atrito provocado por suas superfícies irregulares e pontiagudas. O arredondamento faz com que as mesmas ganhem mais leveza e velocidade. Estas são as contrapartidas pela perda das arestas.

A expressão “ quebrar arestas” também se aplica aos relacionamentos interpessoais. A vida humana pode ser comparada a um rio que leva. Quanto mais intenso é o relacionamento entre duas pessoas, maiores são as oportunidades destas se colidirem e de se quebrarem em suas próprias arestas, consideradas como defesas indevidas ou desnecessárias. A amizade, o namoro, o casamento, o relacionamento entre pais e filhos, entre irmãos, entre professores e alunos, entre colegas de escola ou trabalho, todos os relacionamentos inevitavelmente provocam tensões (atritos). Superfícies que se apresentem com maior dureza, podem resistir mais às colisões e permanecerem por mais tempo sem sofrerem alterações em suas formas. Deste modo, não se arredondam e continuam a atritar com as outras superfícies com a mesma morosidade. Com isso, não conseguem fluir como as outras, com a mesma leveza e rapidez.

As arestas não permitem muitas aproximações entre as pedras. Ao se chocarem, elas imediatamente se afastam umas das outras. São como espinhos que ferem e impedem de se encontrarem em suas partes mais essenciais.

Homens e mulheres possuem arestas. Diferenças e semelhanças podem ser entendidas como ameaças à integridade física e moral por ambos. Dependendo de como essas diferenças são passadas de um para o outro, a compreensão das mesmas pode receber conotação construtiva ou destrutiva, transformando-se em arestas.

O rio e a vida levam. As pedras são carregadas juntamente com as águas rumo ao mar. Na aventura de se viver humanamente, quem sabe perder, permitindo-se quebrar as próprias arestas, não perde verdadeiramente. Consegue entender que, perdendo aprimora-se, o que implica em ganhos maiores, como: maior intimidade e profundidade com os pares, maior leveza e rapidez para chegar ao objetivo.

Por José Morelli