quinta-feira, 31 de maio de 2012

Agir ou reagir?...

Quem age faz as coisas por si mesmo, independentemente da ação de outros. Quem reage as faz influenciado pela ação de outros, como resposta instantânea e automática. A vida de todos os dias é cercada de uma infinidade de estímulos. Correspondê-los ou não depende de cada um. É chamada de impulsiva, a pessoa que responde reativamente a qualquer estímulo, sem parar um instante para pensar se vale ou não à pena reagir apenas, sem nada acrescentar de pessoal, à pergunta ou ao estímulo que lhe foi dirigido. A resposta é dada na mesma intensidade com que veio o estímulo, a favor ou contra as intenções de quem o emitiu. A propaganda oferece produtos de todos os tipos aos consumidores potenciais. A estes compete julgar se a compra será vantajosa ou não. Os consumidores mais esclarecidos não são agentes passivos diante das propagandas. Sabem distinguir as verdadeiras das enganosas. Conhecem seus direitos como consumidor e sabem reinvindicá-los, caso necessário. Conseguem avaliar a qualidade dos produtos, dimensionando-os se correspondem ou não às suas necessidades e desejos. Não somente sabem reagir, sabem também agir. Nas famílias, as atitudes e palavras dos pais se constituem como estímulos educativos para os filhos. Diante desses estímulos, os filhos podem agir ou simplesmente reagir. Se o ambiente é muito exigente e as trocas entre pais e filhos se dão de forma muito rígida, as respostas dos filhos podem ser reativas, um tanto neuróticas, emitidas no sentido de se defenderem, de se preservarem de um poder sentido como castrador e massacrante. Se as ordens dadas pelos pais não soam assim tão inibidoras, os filhos tenderão respondê-las de uma forma menos estressada. Sentirão que podem até mesmo ser criativos em suas respostas, inovando na maneira de buscar soluções para os problemas. Na base das atitudes de agir ou reagir está subjacente o sentido de dignidade e de respeito que é devido a cada pessoa. Adultos e crianças, cada um à sua maneira, precisam perceber que merecem consideração por parte dos outros. Quando percebem assim, nada têm a temer. Suas respostas se tornam mais seguras, podendo ser criativas e proativas, sejam quais forem as circunstâncias em que se dão os fatos.

Por José Morelli

terça-feira, 22 de maio de 2012

Contra-controle

O sentido da palavra controle é bem conhecido. Já o vocábulo contra, nesse contexto, significa aquilo que é contrário, que se opõe. Logo: contra-controle é o mecanismo de se defender da pressão, da fiscalização exercida por outrem... é o esforço, a tentativa de driblar alguma imposição autoritária, de torná-la sem efeito ou de anulá-la simplesmente. 

Resumindo: contra-controle é o controle do controle. Uma observação, mesmo que rápida e superficial, a respeito dos comportamentos das pessoas em geral, permite perceber como esse mecanismo é largamente utilizado e das mais variadas formas: fazendo-se de surdo; de mudo; de mal-entendido quanto ao que está sendo dito; mudando de assunto no meio da conversa; entrando em casa nas pontas dos pés, para não despertar a atenção; adoecendo para escapar da opressão autoritária de alguma incumbência... estas são apenas algumas das formas mais comuns de se colocar em prática esse mecanismo de preservação do direito inalienável de se ter a própria autonomia ou liberdade. Um bom exemplo de contra-controle coletivo pode ser constatado, anos atrás, numa pequena cidade mineira em que me encontrava. Lá havia um sujeito que, apesar de um tanto limitado em suas condições pessoais, adorava falar em público. Todos o sabiam e o respeitavam nesse seu direito. Era o dia 7 de setembro. Na praça da matriz, acontecia o encerramento do desfile comemorativo da Festa da Independência. As autoridades falaram ao microfone uma a uma. Ao término da última, o tal sujeito se apresentou para falar também. O mestre de cerimônias passou-lhe o microfone sem problemas. No mesmo instante, alguém que controlava o som, abaixou totalmente o volume. O público passou a conversar livremente, parecendo entender e já estar familiarizado com o que acontecia. Quando o tal sujeito deu mostras de estar encerrando sua fala, o povo bateu palmas, da mesma forma como o tinha feito com os oradores que o haviam precedido: uma típica solução mineira para algo que, em outro lugar, poderia se constituir como um delicado problema, difícil de ser resolvido sem causar máguas. Pessoas ou instituições muito controladoras correm o risco de mobilizar, naqueles sobre os quais exerce forte poder, mecanismos de contra-controle. A rosca do parafuso espana e o parafuso não consegue ser mais apertado do que já o foi.

Por José Morelli

quinta-feira, 17 de maio de 2012

Masculino & feminino

O masculino, via de regra, expressa suas características diferenciais no próprio corpo de homem e o feminino, da mesma forma, expressa suas características próprias no corpo de mulher. Todo homem, além de trazer em sua mente a imagem do que vem a ser a figura do masculino, traz também a imagem do que vem a ser a figura do feminino. De igual maneira, toda mulher também traz em sua mente a imagem do que vem a ser a figura do feminino, bem como a representação do que vem a ser a imagem do sexo oposto. Pai e mãe contribuem, desde os primeiros anos de vida tanto do menino como da menina, para a formação dessas representações ou imagens. Os progenitores atuam como espelhos onde os filhos se refletem e se vêem. As reações que provocam servem-lhes como reforços (positivos ou negativos), induzindo-os a assumirem com mais ou menos facilidade seus papéis de homem ou de mulher. O pai serve como modelo a ser copiado pelo menino e a mãe serve de modelo a ser copiado pela menina. Na medida em que homem e mulher se desenvolvem no corpo, suas características próprias tendem a se acentuar, atingindo a plena maturidade para o exercício de suas potencialidades. Por sua capacidade e de acordo com a cultura de cada povo, o homem adquire e desenvolve os padrões próprios de comportamento do ser masculino enquanto que a mulher adquire e desenvolve os padrões próprios de comportamento do ser feminino. Além dos pais, outras figuras servem como modelos, tais como os avós, tios e tias, irmãos e irmãs, padrinhos e madrinhas, professores e professoras, babás, amigos, colegas e visinhos, primos e primas, celebridades e artistas que se tornam ídolos a serem imitados. É fundamental que cada indivíduo se sinta seguro ao reproduzir os comportamentos próprios de sua identidade sexual, seja de homem seja de mulher. As interações e trocas entre os sexos opostos precisam ser sentidas como possíveis de serem administradas sem grandes traumas. O sexo oposto não pode representar ameaças de castração (em sentido amplo). Sentir-se podado na própria manifestação pode representar um risco para o desenvolvimento dos papéis, quer masculino quer feminino. Vale, portanto, o & (associativo) utilizado no título desta matéria. Da relativa harmonia entre masculino e feminino decorre a possibilidade de uma vida humanamente mais amistosa e produtiva para ambos os sexos e para a sociedade em seu conjunto.

Por José Morelli

quinta-feira, 10 de maio de 2012

Senso estético

Todos temos um senso estético, isto é: um gosto, uma identificação com formas, sons, sabores, cheiros, sensações táteis, raciocínios, combinações simbólicas, juízos de valores, percepções e sensações parciais e globais, intuições, “feelings”. No dia-a-dia, fazemos uso desse nosso senso ao elegermos aquilo que nos parece ser “melhor” em cada momento, diante das necessidades que nos são impostas. Direta ou indiretamente, nossas escolhas pessoais, umas mais outras menos, influenciam a vida que vivemos, bem como a de outros que, juntamente conosco, formam a sociedade da qual somos parte. Cada decisão humana é fruto de uma consciência pessoal. O exercício da democracia supõe o respeito ao direito do cidadão. As trocas de informações são necessárias para que possamos formar nosso juízo a respeito de partidos, alianças, candidatos e propostas. Do lugar em que nos encontramos, construímos a visão da realidade que nos cerca. Juntando a visão pessoal com as informações vindas de outros, damos à nossa consciência os elementos de que necessita para tomarmos nossas decisões com a base de segurança que nos é possível. Tudo tem sua estética própria. Tudo se desenha e adota formas que devem ser decifradas pelas consciências de cada um. O momento histórico da escolha de novos governantes revoluciona o sistema e o expõe em seus avanços e em seus retrocessos. A leitura individual dos fatos leva-nos às conclusões que o momento nos permite chegar. O voto é pessoal e secreto. Um ato de fé em nós mesmos e no gesto do conjunto que forma a coletividade. Não contamos com nenhuma bola de cristal, que nos garanta certezas quanto ao que decidimos escolher. A vida em nosso planeta está sempre sujeita a mil imprevistos. O processo democrático, constantemente adaptado às necessidades impostas pelas circunstâncias presentes, este sim é o melhor caminho para o amadurecimento político de governantes e governados. A cada nova eleição, temos a chance de aprender um pouco mais. Somos desafiados a desenvolver nossa capacidade de ver e de entender o que se passa na frente e por detrás dos bastidores. Percebemos as deficiências do sistema eleitoral e a necessidade de seu aperfeiçoamento. No entanto, mesmo que endurecidos por conta das desilusões, não devemos nunca perder nosso senso estético, com o qual conseguimos manter-nos animados de esperança.

Por José Morelli

terça-feira, 1 de maio de 2012

A Língua

Da mesma forma como as demais partes de nosso corpo, a língua ocupa seu devido lugar neste, formando um todo harmonioso e condizente com as suas finalidades. Além de ocupar o interior de nossa boca, ela também possui um lugar em nossa mente, como uma imagem, construída a partir de nossas experiências de vida. Por sua cor, formas, mobilidade, consistência, múltiplas funções, históricos pessoais e coletivos, a língua é associada a idéias de todos os tipos: desde as mais elevadas e construtivas até as mais perversas e devastadoras, nos planos individual e grupal. A sensibilidade desse instrumento, tão versátil, permite-lhe a percepção dos diferentes sabores dos alimentos. A memória guarda a lembrança dos gostos um dia experimentados. Mesmo tendo passado muitos anos, a recordação dessas sensações podem voltar, reavivando antigas emoções. A musculatura da língua a torna apta para atender aos comandos do cérebro. Sob as ordens deste, ela dá sua importante parcela de contribuição na emissão da voz, falada ou cantada. A língua é um instrumento a serviço da consciência individual de cada um de nós. Dela podemos fazer uso, de acordo com o que manda nossa cabeça e/ou nosso coração. Se a usamos para fins construtivos, ela poderá merecer elogios, sendo considerada, por nós e pelos outros, como “bendita”. Se, ao contrário, a usamos para fins negativos, sua consideração poderá merecer o qualificativo de “maldita”. No beijo, a língua excita o prazer. Aproximação e distanciamento. O prazer é como uma faca de dois gumes. Se buscado de forma egoísta, centrado apenas na satisfação própria, ele desconhece os direitos inerentes à mutualidade das vinculações, estabelecidas e compartilhadas. A língua é parte de um todo: corpo e mente. Juntamente com esse todo, ela tem saúde ou fica doente. A fragilidade, imposta pela doença, mostra seus sinais através do pulso ou de manifestações de queda das defesas, na língua. Uma boa digestão se reflete em sua cor avermelhada, sem a presença de manchas brancas. “Mostrar a língua” pode ser uma forma de menosprezo. A língua é uma intimidade. Ela é nobre e vil ao mesmo tempo. Ela nos representa no que somos, no que pensamos, no que fazemos, no que sentimos a respeito de nós mesmos e dos outros.

Por José Morelli