quarta-feira, 5 de dezembro de 2012

Contente consigo mesmo

Quem é contente consigo mesmo: o acomodado ou o voluntarioso?... O acomodado é aquele que, sentindo-se satisfeito, não aspira mais do que aquilo que já possui. À semelhança de quem se encontra saciado, é natural que sinta sono e preguiça, necessitando de dar a si e ao próprio estômago o tempo de que precisa para digerir o alimento consumido. O voluntarioso é impulsionado por seus intensos desejos. No que lhe diz respeito, a sabedoria oriental adverte que os desejos, muitas vezes, podem ser a fonte de onde brotam as tristezas e a infelicidade humana. Para se estar contente consigo mesmo é preciso saber lidar com a própria vida em suas múltiplas contingências, administrando-a equilibradamente, a partir da própria perspectiva e da dos outros também.

Faz ainda parte do instintivo de sobrevivência que se pondere na hora de escolher os caminhos a seguir, as metas a serem atingidas, os meios a serem utilizados. No fundo, não deve escapar a todo esse processo a consciência de que tudo tem seu custo e de que cada um paga um preço pelo fato de ser quem é, do jeito que é, de pensar, de sentir, de realizar o que escolhe e se propõe fazer... Animação e desânimo, altos e baixos, fazem parte do curso de qualquer vida, seja qual for o lugar e o tempo em que ela ocorra. 

O contentamento consigo mesmo é o que impulsiona cada um a lançar a bola prá frente, com mais entusiasmo. Dessa base de lançamento, o indivíduo se projeta para fora de si, para além de sua própria individualidade. Na pessoa do outro encontra-se consigo mesmo, tornando-se capaz de reconhecê-lo e estimá-lo.

O existir humano e do mundo é sempre um enigma a ser decifrado. Os acontecimentos se desdobram entrelaçando-se uns nos outros. Nem sempre é possível perceber como se unem esses elos. Há a necessidade de se aprender a conviver com a imprevisibilidade dos fatos.
Sentir-se contente não significa cruzar os braços e nada fazer, permacendo-se como que “deitado em berço esplêndido”. Todo esportista aprende que quanto mais se dedica aos treinamentos, aumentam suas chances de vitória e consequente satisfação. Cada indivíduo pratica sua vida à semelhança de um esportista. No que diz respeito ao contentamento, é preciso aprender a descobri-lo, mesmo que escondido, nAquele que é a razão de ser de tudo o que acontece.

Por José Morelli

terça-feira, 27 de novembro de 2012

Cotovelos

À direita e à esquerda do corpo, estes compõem as junções que unem braços a antebraços. Os cotovelos dão mobilidade, facilitando aproximações e distanciamentos. Se não fossem eles, que dificuldade haveria para que as mãos pudessem chegar à própria boca, trazendo-lhes os alimentos... No conjunto do corpo, os cotovelos ajudam no equilíbrio geral, tornando os braços flexíveis, capazes de uma variedade incrível de movimentos. A imagem de uma bailarina, rodopiando nas pontas dos pés e com os braços erguidos em ângulos, mostra o quanto o corpo ganha em estética por força destes dois caprichos da natureza.

Os cotovelos se encontram em seus devidos lugares no corpo e, também, no conjunto dos pensamentos que a mente cria. Pelo que são e fazem, a mente atribui-lhes significados. Os cotovelos possuem histórias desde tempos imemoriais. Destas histórias, novas referências se criaram, enriquecendo ainda mais o inconsciente coletivo e individual dos seres humanos, quanto à abrangência dos memos no contexto da vida e de todas as peripécias que dela fazem parte.

Expressões na língua portuguesa surgiram, nem se sabe bem por que. O fato é que o dicionário cita "falar pelos cotovelos", que é o mesmo que falar em excesso ou mostrar-se muito loquaz. Outra expressão, bastante usual, é: "dor de cotovelo", indicando a dor de quem foi deixado para trás, no amor. Os cotovelos conseguem abrir espaço na multidão. Podem ser agressivos e reinvindicatórios, legítima ou ilegitimamente. Os cotovelos têm a capacidade de se impor à resistência dos outros. Nesse sentido, eles não são nada inofensivos, muito pelo contrário. Curva de rios ou de estradas, também, são chamadas pelo nome de cotovelo. Retificar rios e estradas pode representar prejuízos à natureza, enrijecendo-a e tornando-a menos saudável e com menor condições de proporcionar qualidade de vida. A pressa, muitas vezes, pode levar a becos sem saída ou a lugar nenhum.

Os cotovelos vivem esquecidos na rotina de suas atividades. Para se fazerem lembrados, é preciso que se manifestem, através de dores ou de inchaços. Muitos nem se conscientizam de que os possuem, só quando um deles se machuca ou dói e reclama do descaso com que é tratado. Acontece, às vezes, de certas dores em articulações, inclusive as dos cotovelos, serem provocadas por situações existenciais/emocionais mal resolvidas. Nestes casos, estas dores se tornam expressões dos conflitos profundos que representam.

Por José Morelli

quarta-feira, 21 de novembro de 2012

Atividade comercial

Comprar e vender implica riscos. Bom senso, coragem e confiança são alguns dos pré-requisitos necessários a todo aquele que se determina a essa atividade. O empenho de suas capacidades humanas se dá em vários sentidos, em várias direções. Através de seu trabalho, o comerciante se projeta profissional e socialmente. Fornecedores e clientes exigem tratamentos diferenciados. Com eles, desenvolve, respectivamente, a arte de comprar e de vender. Sensibilidade, malícia, criatividade não podem faltar ao serem estabelecidos esses relacionamentos.

As leis. São muitas! Leis que regem o tempo, o espaço, os meios circulantes (dinheiro, cheques, promissórias...)  Leis que tratam de taxas e impostos. Leis que garantem direitos e impõem obrigações. Inteligência, previsibilidade, controle da ansiedade são imprescindíveis para administração de tantas responsabilidades.  

O comerciante se relaciona com suas mercadorias. Misturam-se sentimentos de Amor e de  ódio. Olhos, mente e coração envolvem-se nesses sentimentos. Alegria e apreensão quando as mercadorias chegam. Alívio e alegria ainda maior quando estas são vendidas e vão embora, desde que deixem alguma vantagem na transação, seja em dinheiro, que não seja nota falsa ou cheque, que não volte por falta de fundos. Prudência, fé, perseverança.

O exercício do comércio mobiliza capacidades. Atenção, percepção, intuição ou senso de oportunidade. A importância do uso da comunicação verbal e não verbal, nos momentos certos. Segurança, objetividade, discrição e sinceridade na exposição da mercadoria. Nem tudo é perceptível aos olhos. Vender um produto é revelá-lo ao comprador com fidedignidade.

O retorno da atividade comercial não é imediato. Exige um certo tempo. Primeiro é feito o investimento e, só depois de meses ou mesmo anos, é que o lucro começa a aparecer. Determinação, paciência e resistência às frustrações são imprescindíveis para consolidação de um bom empreendimento. A atividade comercial é de grande importância para a sociedade em sua organização funcional. O comerciante é um intermediário, uma ponte que liga as duas margens de um mesmo rio. Assim, ele se sustenta e permite que outros se sustentem também. Um serviço que contribui e viabiliza trocas necessárias e.  mesmo indispensáveis. Um exercício de solidariedade e de cidadania.

Por José Morelli

quarta-feira, 14 de novembro de 2012

O Simbolismo das unhas

Uma longa história compõe o inconsciente coletivo da humanidade. Dessa história fazem parte as unhas, tanto das mãos como dos pés dos seres humanos, desde os seus primórdios. Em sua evolução, o animal-homem se desenvolveu com os recursos de que dispunha, nas diversas fases de seu desenvolvimento. Com a ajuda de suas unhas, ele podia subir e descer as árvores e as encostas íngremes das montanhas, além de se defender e atacar tendo em vista a sua sobrevivência, da mesma forma como se observa nos comportamentos dos outros animais.

Hoje, raramente as pessoas se utilizam das unhas para resolver algum problema do dia-a-dia. Uma infinidade de utensílios as podem substituir com vantagens. Restou para elas, principalmente, um papel estético importante. Um mínimo de cuidado é necessário para que se mantenham saudáveis e bonitas. As unhas fazem parte do todo de cada indivíduo, expressando-o como num teste de personalidade.

Na literatura e no cinema, os personagens do lobisomem, das bruxas e outros mostram o lado agressivo, representado através de longas e ameaçadoras unhas. Por outro lado, a necessidade incontida de roe-las expressa a atitude de auto-agressividade e de timidez perante o enfrentamento com o mundo externo. As unhas funcionam como um termômetro para se avaliar a saúde do corpo e da mente. A falta de vitalidade e de energia encontram um dos primeiros meios de se manifestar através da fraqueza das unhas. Elas se tornam quebradiças e com defeitos que a deformam e enfeiam.

O cuidado das unhas é uma forma de se fazer bem, de amar-se parcial e totalmente. Esse é um caminho para se melhorar a auto-estima: das pontas, das extremidades dos membros superiores e inferiores, para o centro, para o íntimo. Outra via para o reencontro consigo mesmo é o trabalho com os pensamentos e sentimentos. Não basta centrar-se apenas no corpo, em cada uma de suas partes. Para se ter e se sentir com segurança e equilíbrio, garantindo-se da melhor fluição da energia corporal e mental/emocional, é preciso aprender a ler e interpretar as mensagens emitidas pelo corpo, entendendo os simbolismos que representam cada parte. Portanto, dê uma olhada para suas unhas e veja o que elas têm a dizer prá você. Queira-as bem e queira-se bem a partir de suas unhas. Você e todos o merecem!

Por José Morelli

quarta-feira, 31 de outubro de 2012

Caráter delinquente

É o caráter daquele indivíduo que, de uma forma quase irresistível, prefere escolher o descumprimento de leis e normas em vez de ater-se às mesmas, cumprindo-as naturalmente. Apresenta-se constantemente como “do contra”, “nascido do avesso”. Parece não querer percorrer os caminhos tidos como comuns aos simples mortais, insistindo em chamar a atenção mediante adoção de condutas contrárias, mesmo que nocivas ou prejudiciais a si mesmo e aos outros.  Como as demais características das distorções da personalidade humana, estas podem se apresentar de forma graduada, desde as mais tênues até as mais fortes, desde as mais controláveis até as mais difíceis de serem controladas.

Delinquir é o mesmo que descumprir. O delinquente se identifica como exceção à regra que é imposta a todos. Com essa sua maneira de ser e de agir, cria inúmeros problemas no convívio de sua família e no meio social em que se insere. Essa sua maneira de se diferenciar dos outros certamente tem seus fundamentos, suas razões de ser e de se explicar/justificar. A partir de um ponto de vista, o caráter delinquente decorre da contradição existente na própria condição humana que, mesmo não sendo perfeita e completa em suas possibilidades, na mente humana, consciente ou inconscientemente, não desiste de ambicionar a perfeição ou a completude.

O caráter do delinquente é o de uma pessoa que não se conforma com a limitação com que a realidade da vida aparentemente se apresenta. Através de seu modo de julgar e de agir, não entende e condena a todos os outros que procedem de maneira diferente e contrária à sua. Mesmo que não se sinta totalmente seguro quanto ao que faz ou deixa de fazer, adota posturas que parecem traduzir sentimentos de autoconfiança.

O caráter delinquente pode também ser atribuído a grupos de pessoas. O inconformismo certamente deve estar na base da formação daqueles que fazem parte das facções criminosas que controlam o tráfico de drogas e de armas em regiões estrategicamente escolhidas, cujo acesso demandaria dificuldades para ser conseguido pelos órgãos policiais de repressão. Traficante e usuário possuem características semelhantes de distorções na formação da personalidade. Ambos possuem caracteres fortemente contaminados pela sensação de orgulho e de vaidade que a deliquência é capaz de proporcionar a indivíduos e a grupos de indivíduos.

Por José Morelli

quarta-feira, 17 de outubro de 2012

Confiança

Pode não parecer, mas o mundo só se sustenta por causa da confiança. Ela existe e acontece com bem mais freqüência do que podemos imaginar. A natureza é como uma mestra da confiança. Obedecendo suas leis, os dias e as noites se suscedem com extrema precisão. Assim, aprendemos a confiar de que a cada 24 horas surge um novo dia e que, em cada ano, os diversos pontos do planeta passam pelas variações das 4 estações, beneficiando-se do calor, do frio, da chuva e da estiagem. Confiantes, os agricultores, os fabricantes de guarda-chuva, de agasalho ou de roupas leves esperam pela chegada da estação apropriada, para a qual se prepararam em vista de seus produtos.

As pessoas, também, vivem apoiadas na confiança que possuem umas nas outras. A confiança funciona como regra, sendo a desconfiança exceção. Mesmo aqueles que dizem que não confiam, precisam viver como se confiassem. Necessitam de uma confiança básica em si mesmos e nas pessoas com quem convivem mais proximamente; do contrário, não sobreviveriam. Precisam confiar nas coisas que estão a seu uso, bem como nas instituições às quais se inserem. Precisam confiar no ar que respiram, na água que bebem, nos alimentos que consomem, nas roupas que vestem. Se necessitarem de algum remédio, é imprescindível que confiem de que este os fará sarar ou melhorar. Precisam confiar no telefone de que fazem uso, na roupa que escolhem para comprar, no sapato, na bolsa, na arma, no que seja...

O trabalhador confia de que receberá o salário prometido pelo patrão. O patrão tem confiança de que o empregado selecionado executará o trabalho para o qual foi contratado. O motorista confia no carro que dirige, no combustível que utiliza para o fazer movimentar, no breque que aciona para o fazer parar. O jogador de futebol confia no companheiro de equipe, ao passar-lhe a bola. Quem lê confia no que está lendo. O aluno confia nos ensinamentos do professor e será ótimo que o professor confie no aluno, a quem tem por obrigação ensinar. Mesmo aqueles que se envolvem com o crime organizado, precisam confiar na organização a qual fazem parte e de merecer a confiança desta. A perda dessa mútua confiança pode levar a conseqüências indesejáveis para ambas as partes. A confiança, como regra, não merece ser notícia. A quebra da confiança, na qualidade de exceção, é mais rara; por isso, merece ser notícia, ganhando diariamente as páginas dos jornais e os noticiários da TV.

Por José Morelli

quinta-feira, 30 de agosto de 2012

“Não diretividade”

Dependendo das circunstâncias e da condição emocional em que se encontram, os pais poderão adotar para com o filho ou filha, que se encontra em alguma dificuldade, não uma postura diretiva, mas um posicionamento não-diretivo. Atuam não-diretivamente os pais quando, no lugar de raciocinar e decidir pelo filho, ajudam-no a pensar e a concluir o raciocínio por si mesmo. Fazem isto através de uma atitude de quem não tem respostas prontas e mediante formulação de algumas perguntas, que permitam ao filho a utilização do próprio pensamento, assumindo responsabilidade sobre as decisões que deseja tomar. Em vez de os pais se apressarem em oferecer fórmulas feitas, a não-diretividade recomenda-lhes que acreditem nas capacidades do filho. É diretivo o pai ou mãe que pensa que só ele (a) sabe o que é bom e o que é ruim. Não explica ao filho o porquê de seus princípios e valores. Não contribui em nada para que o filho tire conclusões a partir de si mesmo.

O medo, a ansiedade, a falta de confiança em si e no filho são empecilhos a uma atitude facilitadora para que o mesmo adquira autonomia de pensamento e de decisão. Quem tem sempre muita pressa, quem vive com medo de que o erro não tem remédio, não o aceitando como instrumento do saber, não consegue permitir o desenvolvimento do filho, de uma forma gradativa, a partir de suas próprias experiências.

A não-diretividade não é o abandono do filho a si mesmo, na hora em que este tem que enfrentar alguma dificuldade que lhe é intransferível. Os pais não-diretivos não abdicam de suas obrigações, exigidas pelo papel que desempenham junto aos filhos. Pelo contrário, através de suas atitudes, realizam de uma forma mais apropriada aquilo que a palavra “educar” significa: conduzir a partir do interior. A não-diretividade é uma presença profunda e constante. Exige muita observação, muita atenção. Para ajudar o filho a pensar e saber decidir é preciso estar próximo dele, percebê-lo, situá-lo em seu contexto, questioná-lo quanto ao que está pensando e sentindo, permitindo-lhe, assim, que descubra quais são os múltiplos fatores que o estão condicionando. Agir não-diretivamente é interessar-se pelo que de melhor existe no filho como uma forma de querê-lo bem em sua integralidade, de reconhecê-lo em seus lados fortes. É uma aposta nos aspectos mais positivos do filho, mesmo que estes aspectos estejam cercados e protegidos pelo medo ou pelo comodismo. Para se saborear o gosto da castanha é preciso tirá-la de sua casca, sempre protegida de muitos espinhos. De forma parecida, algumas grandezas do espírito humano só são descobertas, quando as resistências são vencidas e os espinhos retirados, mesmo correndo risco de, eventualmente, vir a se machucar com eles.

Por José Morelli

terça-feira, 21 de agosto de 2012

Voz e Vez

O direito constitucional de cada cidadão de se expressar e de ter oportunidade na vida.  Voz e vez. A vez pela voz: voz falada; sussurrada; esbravejada, não importa de qual forma seja. Manifestação da inteligência, das emoções e dos sentimentos humanos mais profundos. Voz e vez do ser na totalidade do corpo e do espírito, penetrando e deixando permear-se pela atmosfera circundante, na ânsia legítima de compartilhar do que é indispensável ao bem viver e dos progressos e conquistas tecnológicas e culturais dos seres humanos, usufruindo-os e podendo se complementar com os mesmos em justa medida.

Pela voz a vez. Vez de poder ocupar e de poder trocar com o espaço físico e psicológico, respirando o ar puro e movimentando-se em todos os sentidos, no exercício pleno do direito de ir e de vir, com liberdade e espontaneamente.

“Quem cala consente” - diz o provérbio. Televisão é comunicação de massa. Telespectador é multidão anônima, necessitada e carente de lazer e de descanso, que pouco ou quase nada contesta e discute idéias. Raramente o espectador é convidado a emitir a própria opinião. Só é instado a responder a questões de mínima importância e, mesmo assim, de forma limitada a um número restrito de alternativas. Cidadão que se omite de manifestar-se falando desconhece o poder da própria voz. Com isso, deixa o espaço livre para aqueles que já se habituaram a ter sempre vez e não são mais capazes de abrir mão do poder que esse ter lhes costuma proporcionar. O problema se torna ainda mais grave quando essa passividade se generaliza, alastrando-se para outros campos da vida dos cidadãos e cidadãs.

A vez é como o ar indispensável à vida da sociedade e do indivíduo. No relacionamento respeitoso entre este e a instituição ocorre o desenvolvimento harmônico do todo. Quando o direito à voz e à vez é negado ou coibido o progresso humano fica sacrificado. Perdas irreparáveis acontecem. A doença prevalece sobre a saúde, o corpo e o espírito embrutecem. A dignidade e o amor próprio perdem a vez.

Por José Morelli

quarta-feira, 15 de agosto de 2012

“Fantasminhas”

A imaginação os criou. As histórias em quadrinhos têm um famoso: o “Gasparzinho”. Nos desenhos animados, eles aparecem na forma de um lençol branco com dois furos, na altura dos olhos, como se existisse alguém embaixo, que o animasse. Quando o lençol é puxado, nada se encontra. Só o lençol é visto, aquilo que dá movimento e vida ao lençol, não.

Podemos comparar a imagem dos fantasminhas, representada pelo lençol, que é a parte visível deles, aos sintomas das doenças (nos quadros neuróticos e psicóticos). O sintoma é apenas a manifestação de um problema de saúde e não, propriamente, o problema em si. A impotência sexual, o medo fóbico, a ansiedade, o comportamento perseverante e compulsivo, a hiperatividade, a angústia, a cleptomania, a depressão, a enurese noturna (xixi na cama) e outros sinais são apenas sintomas, manifestações de conflitos, de problemas mal-resolvidos ou não-resolvidos. Estes não aparecem de forma visível e concreta. São desarmonias e defasagens, choques mesmo entre valores antagônicos, entre consciência e instintos, entre idéias e sentimentos, entre situações externas e internas, “quedas de braço” impostas pelas circunstâncias da vida, difíceis de serem identificadas e bem trabalhadas, para poderem ser mais bem assimiladas, isto é, transformadas em força que alimenta a vida.

O sintoma acena para o problema, é o caminho para ele. Através do sintoma, podemos chegar à sua causa. O sintoma traz em si uma mensagem. Não é à toa que ele se apresenta de uma forma e não de outra. Nele podemos encontrar a pista para desvendarmos nossos segredos íntimos.  É ele como um enigma que precisamos decifrar e entender.

A palavra desvendar significa tirar o véu, que poderia ser entendido, também, como tirar o lençol do fantasminha. Vencendo as resistências naturais à busca do auto-conhecimento, podemos encarar nossos sintomas, sem medo, perguntando-lhes o que escondem por debaixo de suas aparências e o que têm a nos dizer sobre questões importantes de nossa vida, e que tanto comprometem o nosso desempenho e desenvolvimento.

Por José Morelli

sexta-feira, 10 de agosto de 2012

Imagens oníricas

São aquelas produzidas pelos sonhos. Podem ser em branco e preto ou coloridas. É a mente que constrói as imagens de objetos, lugares, animais e pessoas que, juntadas a sons e palavras, se constituem como mensagens úteis para quem está sonhando. Buscadas do arquivo da memória, essas imagens vão sendo projetadas compondo pequenas ou grandes histórias: umas de fácil entendimento outras parecendo não terem nem pé nem cabeça.  

Desejos, preocupações, frustrações podem se manifestar por meio de imagens oníricas que mobilizam sentimentos e emoções. Os sonhos servem à vida, ajudam-na a elaborar os conflitos que nela acontecem. Não é a toa que se tem um sonho e não outro. Não é a toa que nele aparece uma determinada pessoa e não outra. Existem razões importantes para isso. Nos sonhos, o psiquismo humano possui um meio eficaz de enfrentar seus medos e resistências. Neles, a mente se torna mais livre das censuras impostas pela consciência das normas que lhe foram introjetadas, desde a sua primeira fase de desenvolvimento.

Por meio do convívio social, o indivíduo capta os significados de tudo ou de quase tudo. O pensamento coletivo influencia no modo de pensar e de sentir dos indivíduos, ocorrendo certa universalização dos significados atribuídos às coisas e das emoções e sensações a eles associados.

A vivência pessoal também contribui para o enriquecimento de significados a serem atribuídos às situações representadas pelas imagens oníricas. Quem viveu, na infância, uma experiência na qual uma determinada flor ou música ficaram associadas a sensações de prazer, ao criar essas mesmas imagens, anos mais tarde, em algum sonho, estas promoverão as mesmas sensações de prazer experimentadas no passado.

Sonhar e lembrar do sonho é uma coragem, uma forma sadia de enfrentamento das dificuldades da vida. Na medida em que a mente sonha, ela vai se tornando mais consciente dos problemas que enfrenta, podendo se familiarizar com os mesmos. Pouco a pouco, vai ganhando mais poder e confiança em si, podendo quebrar algumas das barreiras que ela própria construiu em suas vivências do passado.

Por José Morelli

domingo, 29 de julho de 2012

“Acertar os ponteiros”

Se meu relógio de ponteiros está parado ou errado, preciso urgentemente acertá-lo, sob risco de perder algum compromisso importante. Para isso, necessito adotar dois procedimentos, pelo menos: primeiro, identificar a hora certa; segundo, mover os ponteiros (das horas, dos minutos e dos segundos), ajustando-os a seus respectivos indicadores, no mostrador, de acordo com a hora certa do fuso-horário em que me encontro.

Se o relógio não atrasa nem adianta, os ponteiros caminham numa velocidade comparada à da Terra, em seu movimento de rotação (ao redor de si mesma). Desde que os ponteiros tenham sido acertados, passará a haver uma maior coincidência nos movimentos destes com os períodos de 24 horas do dia. Desta forma, meu relógio estará em condições para servir-me, em seu objetivo de marcar o tempo, ajudando-me a administrá-lo melhor.


Quando ouço alguém dizer que precisa “acertar os ponteiros”, dependendo do contexto da frase, entendo que não está se referindo ao acerto dos ponteiros do relógio propriamente dito, mas a outro tipo de acerto, que pode ser: na vida pessoal; nos negócios; nos estudos; no casamento; nos relacionamentos de amizade ou em qualquer outro aspecto da vida, que esteja exigindo uma atenção maior de sua parte.


Nestes casos, o relógio e seus ponteiros servem como referências simbólicas. Dia, noite, movimento, rotação / translação, sol / lua / estrelas, mês / ano / século / milênio, atrasar / parar / adiantar, horários normal e de verão, acertos necessários de tempo em tempo, estas são algumas das contingências, que acompanham a vida dos relógios e das pessoas.


Problemas menores para acerto dos ponteiros do relógio podem ser solucionados pelo próprio usuário, outros mais intrincados apenas pelo relojoeiro. Da mesma forma, para “acertar os ponteiros”, da vida, muitas vezes não é necessário senão o concurso da própria pessoa, sem que precise da ajuda especializada de ninguém. Outras vezes, porém, é indispensável contar com a participação não do relojoeiro mas de um profissional, que estuda e se dedica à vida das pessoas e ao intrincado mecanismo de seu funcionamento. Um desses profissionais é o psicólogo ou psicoterapeuta.


Por José Morelli

quinta-feira, 26 de julho de 2012

Em espiral

Entre idas e vindas, na direção para frente e para cima, alargando o horizonte de visão, a cada volta, ou diminuindo o sentido de oposição, entre opostos, vou evoluindo e me desenvolvendo, de maneira semelhante ao da  e s p i r a l, delineando seu traçado.

Se, em algum momento, o medo me impediu de alcançar um ponto mais avançado e que exigia preparo e coragem de minha parte, fazendo-me retroceder; agora, sentindo-me mais preparado e com menos medo, posso me lançar mais confiante. Neste vai e vem, cresço em minhas capacidades, amplio o sentido de minha presença, no meio em que vivo e em que me movimento. Alimento e faço crescer meu auto-conhecimento e minha auto-estima.

Minha vida oscila entre a rotina e a novidade. Ambas são importantes e mesmo necessárias. Quando me canso de uma, busco a outra, satisfazendo-me a cada nova experiência. Rotina e busca de novidades servem-me como estímulo. Na medida em que vou me cansando da rotina, cresce-me o incômodo de nela permanecer. Busco, então, a novidade... até que me canse dela também. A rotina volta a atrair-me, gratificando-me com sua presença. Sinto-me feliz por reencontrá-la. Vou oscilando nesse processo, que me parece ser saudável e capaz de atender às minhas necessidades, desenvolvendo-me em mais dimensões de meu ser total. Devo cuidar para que a ansiedade em buscar fora ou o medo/comodismo, que me levariam a fugir das dificuldades, não me prejudiquem nessa dinâmica que é apropriada à vida.

A cada nova volta na espiral, envolvo-me mais profundamente comigo mesmo e com a realidade que me cerca, ampliando e aprofundando minhas percepções. Descubro que, no que é bom, não existe só o bom e que no mal, não existe só o mal. Minha visão dos contrários vai se tornando mais objetiva, menos mítica. Dentro de mim, diminuo a distância entre os opostos. Aprendo a lidar melhor com eles. Integro-os em minha maneira de ver e entender o mundo e a vida. Sucessos e fracassos deixam de atemorizar-me tanto. Vou perdendo o medo de avançar e de me arriscar. Sinto-me mais assumido e responsável no que penso, sinto e faço.

Por José Morelli

quinta-feira, 12 de julho de 2012

Efeito bumerangue

O bumerangue é uma arma de arremesso, confeccionada de madeira escavada e em forma de arco, utilizada pelos indígenas australianos. Quando atirada, descreve curvas no ar e volta ao ponto de onde saiu.

O efeito bumerangue é, justamente, essa volta da arma para a pessoa que a arremessou. Com o sentimento de culpa e o remorso parece acontecer algo parecido. Quando falamos ou praticamos uma ação que percebemos prejudicar alguém, podemos sentir como se o mal que fizemos, voltasse para nós, perseguindo-nos e querendo nos ferir também.

O remorso é um sentimento que mistura culpa, arrependimento, vontade de se esconder ou de evitar ver/encarar a pessoa, a quem ferimos ou magoamos. É comum acontecer que o simples pensamento ou desejo de prejudicar alguém já possa nos fazer sentir remorso. Às vezes, esse simples pensamento reprimido, é capaz de nos fazer tropeçar ou bater a cabeça, como uma espécie de autopunição inconsciente. Outras vezes, é capaz de nos tirar a tranquilidade do sono, causando-nos algum sonho desagradável ou mesmo pesadelo.

O remorso tanto pode ter uma intensidade proporcional àquilo que pensamos ou fizemos de mal ou de errado, como pode ter uma intensidade exageradamente desproporcional. Este segundo caso já é indicativo de certo distúrbio psiquiátrico. A paranóia é uma doença em que a pessoa se sente perseguida e ameaçada de várias maneiras. O paranóico não consegue imaginar que os outros sejam capazes de entendê-lo e de perdoá-lo, uma vez que ele mesmo não consegue entender-se e não é capaz de perdoar-se.

O alcoólatra e o usuário de drogas podem ser levados ao vício por esse sentimento forte de culpa e de perseguição, originados por uma auto-imagem demasiadamente negativa de si mesmos. Exigem demais de si e se cobram perfeição. Consequentemente, não conseguem ter auto-estima. Intimamente julgam-se maus. Imaginam que tudo o que são, pensam, dizem e fazem é mau e, fatalmente, só poderão merecer a perseguição e a destruição por parte dos outros. Inconscientemente, pela bebida ou pelo tóxico, buscam a própria destruição, como por força de um castigo ou de uma sina, contra a qual se sentem impotentes de fazer qualquer coisa, para que dela possam se libertar.

Por José Morelli

sexta-feira, 6 de julho de 2012

Umbigo

O umbigo tem história na vida de cada um de nós. Ainda no útero de nossa mãe, foi através do chamado cordão umbilical que recebemos os nutrientes necessários ao nosso crescimento e desenvolvimento. Ao nascermos, este cordão foi cortado e amarrado até que cicatrizasse. Passados alguns dias, a parte excedente do cordão caiu, dando origem ao umbigo, propriamente dito. Com isso, desligamo-nos de nossa mãe e ganhamos independência, do ponto de vista físico. Iniciamos a primeira etapa no caminho de nossa autonomia. O umbigo ocupa um lugar central em nosso corpo, ficando ao alcance de nossos olhos e podendo ser visto com relativa facilidade.

Entre as expressões de linguagem encontradas, referentes ao cordão umbilical, temos aquela que nos diz que chega um momento na vida em que devemos cortá-lo definitivamente, significando a necessidade de rompermos os vínculos de dependência que possam nos estar ligando indevidamente a nossos pais, mantendo-nos infantis e impedidos de tornar-nos adultos. Outras duas expressões são aquelas que dizem que não devemos nos centrar em nosso próprio umbigo, indicando uma preocupação egoísta conosco mesmos, e aquela outra que nos recomenda que tomemos cuidado para que não nos consideremos o umbigo do mundo, isto é, o centro de todas as atenções, sujeito apenas com direitos, mas sem obrigações.

Hoje, a moda vem permitindo que o umbigo fique mais em evidência. Há quem até o adorne com piercing, destacando-o ainda mais. É provável que tudo isso seja a expressão da ansiedade dos jovens em adquirirem a própria liberdade e autonomia, bem como do individualismo, que a vida moderna propõe, através da voracidade de tantos apelos de consumo.

Corpo e mente são intimamente relacionados. Todas as partes do corpo são dignas de atenção e de estima. O resgate do umbigo, como parte a ser mostrada e valorizada pela estética da moda, pode ajudar no esforço constante de aproximação entre mente e corpo. Os hábitos são cíclicos. A cada volta deste ciclo são buscadas maneiras novas de expressão da vida por sua magnitude e intensidade. Cabe a cada pessoa escolher a maneira ou maneiras com que pode expressar-se, de modo a espelhar a harmonia com que se relaciona consigo mesma e com os outros.


Por José Morelli

quinta-feira, 5 de julho de 2012

“A raposa e a uvas”

Caminhando debaixo de belas e atraentes parreiras, carregadas de apetitosas uvas, a raposa se rendeu a seus encantos, não resistindo ao impulso de saboreá-las. Começou pois a dar saltos e mais saltos, tentando alcançá-las. No entanto, todos os seus esforços não obtiveram efeito algum. Exausta, não teve outra saída senão desistir de seu intento. Ao afastar-se, conversou consigo mesma, dizendo: "não faz mal que não tenha conseguido alcançá-las, uma vez que as uvas se encontravam verdes, verdes e azedas!" Dessa forma, a raposa acalmou o seu espírito, poupando-se de sofrer duplamente: primeiro, por não ter podido usufruir das uvas, que antes lhe tinham parecido tão saborosas; segundo, pela sensação de fracasso por não ter sido capaz de alcançá-las.

Esta conhecida fábula de Esopo se constitui como um dos mais expressivos exemplos do que vem a ser o mecanismo de defesa, chamado de racionalização. Racionalizar é o mesmo que encontrar razões, justificativas ou explicações que possam fazer convencer do contrário do que a realidade está mostrando, com o intuito de poupar-se de sofrimentos maiores.

Ninguém gosta de sofrer frustrações. A necessidade de ver concretizadas suas expectativas, leva as pessoas a esperarem muito das coisas, dos outros e de si mesmas. A utilização do mecanismo de racionalização é muito mais frequente do que se pode imaginar. Todos os dias, são muitas as situações que o mobilizam. Dependendo da resistência, da capacidade da pessoa de suportar frustrações, esta terá mais ou menos a tendência de utilizá-lo, com o objetivo de se auto-preservar em sua integridade física e/ou psicológica.

Mentir para si mesmo pode ser mais fácil do que mentir para o outro. Quando se tem muito interesse sobre alguma coisa, o risco de se desvirtuar o pensamento é maior. Desconfiar da própria percepção e do próprio juízo, solicitando o parecer de uma outra pessoa, pode ser uma forma de se proteger contra a própria arbitrariedade.

Na medida em que as pessoas amadurecem, tornando-se adultas e responsáveis, aumentam também a própria capacidade de se verem sem medos e sem receios de se decepcionarem consigo mesmas. Ficam menos necessitadas de fazerem uso de mecanismos de racionalização, tornando-se mais verdadeiras consigo mesmas e com os outros.

Por José Morelli

sábado, 23 de junho de 2012

Arte de Imitar

Desde bem pequena, a criança demonstra que possui a capacidade de apreender e imitar os comportamentos dos adultos. Ao brincar, é comum a menina inverter os papéis: ela é a mamãe, enquanto que a boneca é o nenê. Nesse jogo, ela se exercita em reproduzir o jeito de ser e de se comportar de sua mãe, nas palavras e nos gestos, ao falar com sua boneca, dando-lhe comida ou chamando-lhe a atenção.

Se um adulto se predispõe a brincar de escolinha com uma criança, dificilmente esta aceitará ficar na posição de aluno. Logo assume uma postura de autoridade, impondo-se exigindo de seu par que este se comporte de acordo com o que lhe é apropriado.

Ao brincar de carrinho, o menino imita os gestos do motorista: no jeito de virar a direção, de buzinar, de reproduzir os sons do veículo.  As imagens do que se pode fazer com uma bola muito cedo vão sendo captadas pelos olhos e pelas mentes das crianças. Umas têm mais facilidade de reproduzi-las outras têm menos. Da imitação nasce, depois, a criatividade: junção do novo com o velho. Nesse processo, habilidades vão se aprimorando. 

O ser humano tem construído culturas, no decorrer de toda sua história. No convívio com a natureza e com os animais, ele aprendeu a imitar gestos e movimentos que se transformaram em danças, bem como sons que se transformaram e belíssimas melodias. O repertório de maneiras de expressar a vida, em seus aspectos positivos e negativos, é inesgotável. O movimento das ondas do mar, o vôo dos pássaros, o modo de andar e de saltar de alguns bichos, as cores e os sons, encontrados na natureza, sempre inspiraram artistas e não-artistas.

A sociedade evolui. A competição é acirrada em todos os sentidos. A transmissão de modelos de uns para com os outros é imprescindível. Não basta a imitação das formas concretas de se responder às necessidades, é preciso também desenvolver modelos que inspirem avanços nas maneiras de sentir e de interpretar a existência humana e de tudo o que dela participa.

Por José Morelli

sexta-feira, 8 de junho de 2012

Apaixonados/as

A paixão não é privilégio apenas das mulheres. Ambos os sexos podem se tornar vítimas de uma paixão. Amor e paixão não são palavras sinônimas, com significados idênticos. Não que no amor não possa existir paixão e que na paixão não possa existir amor. Estes dois termos não se encaixam totalmente. Além disso, como as palavras servem à vida e esta é dinâmica, sofrendo modificações constantemente, do amor se pode passar à paixão e da paixão se pode passar ao amor.

Ninguém tem o poder de julgar sobre o que acontece no pensamento e no sentimento de qualquer outra pessoa. O que se passa na alma só o proprio individuo tem acesso. Às vezes, nem ele mesmo consegue avaliar com clareza o que traz em seu íntimo e é natural que, vez ou outra, se sinta confuso e inseguro por isso. 

 A pessoa apaixonada se mostra também obstinada. Não aceita pela metade. Quer realizar por inteiro seus desejos, sem restrições. Um leve sinal de desatenção a faz temer perder. Agarra-se com todas as forças. Sofre. Paixão vem de padecer, padecimento. Paixão doentia é aquela na qual a pessoa perde todo senso de objetividade. Perde a noção de si mesma e de seus próprios limites. Invade “na maior” sem a menor cerimônia. 

Em casos extremos, paixão e ciúmes se aliam, enveredando frequentemente por caminhos trágicos. Dependendo da intensidade, a paixão faz da pessoa vítima de seus próprios sentimentos e fantasias. 

 Paixão bem dosada. Um pouco de sofrimento não faz mal a ninguém. Sofrer em dosagens suportáveis pela pessoa amada e temer perdê-la, dedicando-se mais a ela para que isso não aconteça, valoriza humanamente o relacionamento, fortalecendo os laços que unem duas pessoas. Tanto o sofrimento como o prazer se constituem como estímulos. A vida é sentida de forma produtiva, quando acompanhada de estímulos tanto dolorosos como prazeirosos, mas que não ultrapassem as capacidades das pessoas de suportá-los. 

As pessoas que se amam devem aprender também a trocar coisas boas entre si: palavras de agrado; gestos carinhosos e de aconchego; atitudes generosas. Quanto às trocas dolorosas, estas são muitas vezes inevitáveis. Cada pessoa tem seu peso natural e normal. O Evangelho recomenda que as pessoas precisam aprender a carregar os fardos uns dos outros. A promessa que os noivos se fazem, na hora em que se casam, é a de que devem viver o amor tanto na alegria como na tristeza, tanto na saúde como na doença.

Por José Morelli

quinta-feira, 31 de maio de 2012

Agir ou reagir?...

Quem age faz as coisas por si mesmo, independentemente da ação de outros. Quem reage as faz influenciado pela ação de outros, como resposta instantânea e automática. A vida de todos os dias é cercada de uma infinidade de estímulos. Correspondê-los ou não depende de cada um. É chamada de impulsiva, a pessoa que responde reativamente a qualquer estímulo, sem parar um instante para pensar se vale ou não à pena reagir apenas, sem nada acrescentar de pessoal, à pergunta ou ao estímulo que lhe foi dirigido. A resposta é dada na mesma intensidade com que veio o estímulo, a favor ou contra as intenções de quem o emitiu. A propaganda oferece produtos de todos os tipos aos consumidores potenciais. A estes compete julgar se a compra será vantajosa ou não. Os consumidores mais esclarecidos não são agentes passivos diante das propagandas. Sabem distinguir as verdadeiras das enganosas. Conhecem seus direitos como consumidor e sabem reinvindicá-los, caso necessário. Conseguem avaliar a qualidade dos produtos, dimensionando-os se correspondem ou não às suas necessidades e desejos. Não somente sabem reagir, sabem também agir. Nas famílias, as atitudes e palavras dos pais se constituem como estímulos educativos para os filhos. Diante desses estímulos, os filhos podem agir ou simplesmente reagir. Se o ambiente é muito exigente e as trocas entre pais e filhos se dão de forma muito rígida, as respostas dos filhos podem ser reativas, um tanto neuróticas, emitidas no sentido de se defenderem, de se preservarem de um poder sentido como castrador e massacrante. Se as ordens dadas pelos pais não soam assim tão inibidoras, os filhos tenderão respondê-las de uma forma menos estressada. Sentirão que podem até mesmo ser criativos em suas respostas, inovando na maneira de buscar soluções para os problemas. Na base das atitudes de agir ou reagir está subjacente o sentido de dignidade e de respeito que é devido a cada pessoa. Adultos e crianças, cada um à sua maneira, precisam perceber que merecem consideração por parte dos outros. Quando percebem assim, nada têm a temer. Suas respostas se tornam mais seguras, podendo ser criativas e proativas, sejam quais forem as circunstâncias em que se dão os fatos.

Por José Morelli

terça-feira, 22 de maio de 2012

Contra-controle

O sentido da palavra controle é bem conhecido. Já o vocábulo contra, nesse contexto, significa aquilo que é contrário, que se opõe. Logo: contra-controle é o mecanismo de se defender da pressão, da fiscalização exercida por outrem... é o esforço, a tentativa de driblar alguma imposição autoritária, de torná-la sem efeito ou de anulá-la simplesmente. 

Resumindo: contra-controle é o controle do controle. Uma observação, mesmo que rápida e superficial, a respeito dos comportamentos das pessoas em geral, permite perceber como esse mecanismo é largamente utilizado e das mais variadas formas: fazendo-se de surdo; de mudo; de mal-entendido quanto ao que está sendo dito; mudando de assunto no meio da conversa; entrando em casa nas pontas dos pés, para não despertar a atenção; adoecendo para escapar da opressão autoritária de alguma incumbência... estas são apenas algumas das formas mais comuns de se colocar em prática esse mecanismo de preservação do direito inalienável de se ter a própria autonomia ou liberdade. Um bom exemplo de contra-controle coletivo pode ser constatado, anos atrás, numa pequena cidade mineira em que me encontrava. Lá havia um sujeito que, apesar de um tanto limitado em suas condições pessoais, adorava falar em público. Todos o sabiam e o respeitavam nesse seu direito. Era o dia 7 de setembro. Na praça da matriz, acontecia o encerramento do desfile comemorativo da Festa da Independência. As autoridades falaram ao microfone uma a uma. Ao término da última, o tal sujeito se apresentou para falar também. O mestre de cerimônias passou-lhe o microfone sem problemas. No mesmo instante, alguém que controlava o som, abaixou totalmente o volume. O público passou a conversar livremente, parecendo entender e já estar familiarizado com o que acontecia. Quando o tal sujeito deu mostras de estar encerrando sua fala, o povo bateu palmas, da mesma forma como o tinha feito com os oradores que o haviam precedido: uma típica solução mineira para algo que, em outro lugar, poderia se constituir como um delicado problema, difícil de ser resolvido sem causar máguas. Pessoas ou instituições muito controladoras correm o risco de mobilizar, naqueles sobre os quais exerce forte poder, mecanismos de contra-controle. A rosca do parafuso espana e o parafuso não consegue ser mais apertado do que já o foi.

Por José Morelli

quinta-feira, 17 de maio de 2012

Masculino & feminino

O masculino, via de regra, expressa suas características diferenciais no próprio corpo de homem e o feminino, da mesma forma, expressa suas características próprias no corpo de mulher. Todo homem, além de trazer em sua mente a imagem do que vem a ser a figura do masculino, traz também a imagem do que vem a ser a figura do feminino. De igual maneira, toda mulher também traz em sua mente a imagem do que vem a ser a figura do feminino, bem como a representação do que vem a ser a imagem do sexo oposto. Pai e mãe contribuem, desde os primeiros anos de vida tanto do menino como da menina, para a formação dessas representações ou imagens. Os progenitores atuam como espelhos onde os filhos se refletem e se vêem. As reações que provocam servem-lhes como reforços (positivos ou negativos), induzindo-os a assumirem com mais ou menos facilidade seus papéis de homem ou de mulher. O pai serve como modelo a ser copiado pelo menino e a mãe serve de modelo a ser copiado pela menina. Na medida em que homem e mulher se desenvolvem no corpo, suas características próprias tendem a se acentuar, atingindo a plena maturidade para o exercício de suas potencialidades. Por sua capacidade e de acordo com a cultura de cada povo, o homem adquire e desenvolve os padrões próprios de comportamento do ser masculino enquanto que a mulher adquire e desenvolve os padrões próprios de comportamento do ser feminino. Além dos pais, outras figuras servem como modelos, tais como os avós, tios e tias, irmãos e irmãs, padrinhos e madrinhas, professores e professoras, babás, amigos, colegas e visinhos, primos e primas, celebridades e artistas que se tornam ídolos a serem imitados. É fundamental que cada indivíduo se sinta seguro ao reproduzir os comportamentos próprios de sua identidade sexual, seja de homem seja de mulher. As interações e trocas entre os sexos opostos precisam ser sentidas como possíveis de serem administradas sem grandes traumas. O sexo oposto não pode representar ameaças de castração (em sentido amplo). Sentir-se podado na própria manifestação pode representar um risco para o desenvolvimento dos papéis, quer masculino quer feminino. Vale, portanto, o & (associativo) utilizado no título desta matéria. Da relativa harmonia entre masculino e feminino decorre a possibilidade de uma vida humanamente mais amistosa e produtiva para ambos os sexos e para a sociedade em seu conjunto.

Por José Morelli

quinta-feira, 10 de maio de 2012

Senso estético

Todos temos um senso estético, isto é: um gosto, uma identificação com formas, sons, sabores, cheiros, sensações táteis, raciocínios, combinações simbólicas, juízos de valores, percepções e sensações parciais e globais, intuições, “feelings”. No dia-a-dia, fazemos uso desse nosso senso ao elegermos aquilo que nos parece ser “melhor” em cada momento, diante das necessidades que nos são impostas. Direta ou indiretamente, nossas escolhas pessoais, umas mais outras menos, influenciam a vida que vivemos, bem como a de outros que, juntamente conosco, formam a sociedade da qual somos parte. Cada decisão humana é fruto de uma consciência pessoal. O exercício da democracia supõe o respeito ao direito do cidadão. As trocas de informações são necessárias para que possamos formar nosso juízo a respeito de partidos, alianças, candidatos e propostas. Do lugar em que nos encontramos, construímos a visão da realidade que nos cerca. Juntando a visão pessoal com as informações vindas de outros, damos à nossa consciência os elementos de que necessita para tomarmos nossas decisões com a base de segurança que nos é possível. Tudo tem sua estética própria. Tudo se desenha e adota formas que devem ser decifradas pelas consciências de cada um. O momento histórico da escolha de novos governantes revoluciona o sistema e o expõe em seus avanços e em seus retrocessos. A leitura individual dos fatos leva-nos às conclusões que o momento nos permite chegar. O voto é pessoal e secreto. Um ato de fé em nós mesmos e no gesto do conjunto que forma a coletividade. Não contamos com nenhuma bola de cristal, que nos garanta certezas quanto ao que decidimos escolher. A vida em nosso planeta está sempre sujeita a mil imprevistos. O processo democrático, constantemente adaptado às necessidades impostas pelas circunstâncias presentes, este sim é o melhor caminho para o amadurecimento político de governantes e governados. A cada nova eleição, temos a chance de aprender um pouco mais. Somos desafiados a desenvolver nossa capacidade de ver e de entender o que se passa na frente e por detrás dos bastidores. Percebemos as deficiências do sistema eleitoral e a necessidade de seu aperfeiçoamento. No entanto, mesmo que endurecidos por conta das desilusões, não devemos nunca perder nosso senso estético, com o qual conseguimos manter-nos animados de esperança.

Por José Morelli

terça-feira, 1 de maio de 2012

A Língua

Da mesma forma como as demais partes de nosso corpo, a língua ocupa seu devido lugar neste, formando um todo harmonioso e condizente com as suas finalidades. Além de ocupar o interior de nossa boca, ela também possui um lugar em nossa mente, como uma imagem, construída a partir de nossas experiências de vida. Por sua cor, formas, mobilidade, consistência, múltiplas funções, históricos pessoais e coletivos, a língua é associada a idéias de todos os tipos: desde as mais elevadas e construtivas até as mais perversas e devastadoras, nos planos individual e grupal. A sensibilidade desse instrumento, tão versátil, permite-lhe a percepção dos diferentes sabores dos alimentos. A memória guarda a lembrança dos gostos um dia experimentados. Mesmo tendo passado muitos anos, a recordação dessas sensações podem voltar, reavivando antigas emoções. A musculatura da língua a torna apta para atender aos comandos do cérebro. Sob as ordens deste, ela dá sua importante parcela de contribuição na emissão da voz, falada ou cantada. A língua é um instrumento a serviço da consciência individual de cada um de nós. Dela podemos fazer uso, de acordo com o que manda nossa cabeça e/ou nosso coração. Se a usamos para fins construtivos, ela poderá merecer elogios, sendo considerada, por nós e pelos outros, como “bendita”. Se, ao contrário, a usamos para fins negativos, sua consideração poderá merecer o qualificativo de “maldita”. No beijo, a língua excita o prazer. Aproximação e distanciamento. O prazer é como uma faca de dois gumes. Se buscado de forma egoísta, centrado apenas na satisfação própria, ele desconhece os direitos inerentes à mutualidade das vinculações, estabelecidas e compartilhadas. A língua é parte de um todo: corpo e mente. Juntamente com esse todo, ela tem saúde ou fica doente. A fragilidade, imposta pela doença, mostra seus sinais através do pulso ou de manifestações de queda das defesas, na língua. Uma boa digestão se reflete em sua cor avermelhada, sem a presença de manchas brancas. “Mostrar a língua” pode ser uma forma de menosprezo. A língua é uma intimidade. Ela é nobre e vil ao mesmo tempo. Ela nos representa no que somos, no que pensamos, no que fazemos, no que sentimos a respeito de nós mesmos e dos outros.

Por José Morelli

sexta-feira, 27 de abril de 2012

Para-tarefa

Quando um grupo de pessoas se propõe realizar um trabalho ou uma tarefa; antes que todos e cada um iniciem suas partes, é necessário que se dediquem a uma atividade prévia, que é chamada pelos teóricos dos grupos operativos, com o nome de para-tarefa. A para-tarefa antecede a ação que o grupo tem como objetivo realizar. Exige tempo e dispêndio de energia. É através dela que o grupo se prepara para o que vai fazer. Sem esta preparação, ele não conseguiria as condições ideais para empreender aquilo para o qual ele foi constituído. Não é preciso ir muito longe para entender. Imagine se a tarefa a ser realizada é a de um jogo de futebol, quantas para-tarefas são necessárias para que a equipe de jogadores se encontre preparada para o enfrentamento com o adversário?... E, no caso de a tarefa ser a de uma orquestra que deve se apresentar num grande concerto... Quanto tempo e esforço são necessários para que todos, músicos e instrumentos, se ajustem e adquiram a harmonia necessária que garanta a excelência da apresentação? Através da para-tarefa, quebram-se as arestas, as diferenças de intenções, de pensamentos, de pré-conceitos, de expectativas, que podem comprometer o bom resultado das ações grupais. Através da boa execução dessa fase, os membros do grupo passam a se conhecer melhor, passam a se entender em seus pontos de vista, aprendem a confiar uns nos outros, descobrem as maneiras de se fazer mais bem entendidos, deixam-se perceber no grau de envolvimento com que se lançam ao objetivo que é comum, aprendem a se complementar na construção de suas idéias e na criatividade, ampliam o sentimento de liberdade de falarem, sem receios, sobre o que pensam e sentem. Quanto mais exigente é a tarefa a ser realizada pelo grupo, maior será também a necessidade deste se dedicar à para-tarefa, à boa afinação de cada um de seus membros com o objetivo a que se propuseram.

Por José Morelli

sexta-feira, 20 de abril de 2012

Efeito terapeutizante

Dentre os livros escritos por Carl Rogers um dos mais conhecidos intitula-se “Tornar-se Pessoa”. A esse autor é atribuída a afirmação de que “todo relacionamento autêntico é terapêutico”. Uma conversa tranquila entre amigos não possui, diretamente e em primeiro lugar, o objetivo de promover a cura psicológica daqueles que dela participam; no entanto, nada impede que, dessa conversa, resulte um efeito colateral, que promova uma certa cura, uma certa harmonização interna e externa, que ajuda na saúde da pessoa. Ao efeito assim obtido não é dado o nome de efeito terapêutico mas o de efeito terapeutizante.

Esse mesmo efeito pode ser obtido de um passeio ao ar livre, de uma caminhada, de uns dias de férias bem aproveitados, da convência diária com pessoas que se quer bem, de ouvir a uma bela música, de participar de uma dança, de uma atividade lúdica entre crianças ou adultos, de um trabalho produtivo e gratificante, da leitura de um bom livro, da criação ou reprodução de uma obra artística, de uma meditação na intimidade consigo mesmo, do assistir a um bom filme ou a um bem elaborado programa de televisão. O contato ou interação com a harmonia externa ajuda à harmonização interna.

À saúde se contrapõe a doença. Ambas fazem parte da realidade da vida. Um diálogo é mantido entre saúde e doença. As pessoas protagonizam esse diálogo constantemente. Mesmo quando parecem distraídas, entretidas pela saúde e a doença nem consegue lhes passar pela cabeça, ainda assim, o medo do adoecer está presente, não permitindo que a tranquilidade do espírito seja completa.

A vida é administrada. Administra-se a vida com tudo o que dela faz parte. Saúde e doença são como enígmas. Possuem segredos difíceis de serem desvendados. Cada pessoa lida, à sua maneira, com o que a pode levar à saúde ou à doença. Há aqueles que gostam de brincar com o perigo, gostam de desafiá-lo, parece sentirem-se vitoriosos, mais vivos e saudáveis quando conseguem superá-lo, mostrando-se mais hábeis e fortes que o perigo que os ameaça. Colocando essas questões dessa forma, talvez se poderia afirmar que a prática de esportes radicais possui, também, a capacidade de promover efeito terapeutizante naqueles que se sentem fortemente atraídos a vivenciar emoções fortes, arriscando-se e vivendo perigosamente.

Por José Morelli

quinta-feira, 12 de abril de 2012

Administrar o tempo

Sendo uma contingência da matéria, o tempo acompanha tudo o que fazemos. Mesmo os nossos pensamentos e sentimentos não acontecem sem ele e não deixam de ser condicionados por ele. Para se poder administrar o tempo é preciso certas condições de equilíbrio emocional. A ansiedade pode ser um obstáculo na realização dessa importante tarefa. A sensação de vazio e a ânsia de preenchê-lo dificultam estarmos por inteiro naquilo que temos diante de nós e que é nossa incumbência do momento presente.

A falta de organização na hora de executarmos nossas atribuições acaba aumentando nossa ansiedade. Forma-se, então, um círculo vicioso, que faz agravar cada vez mais o contexto geral em que nos inserimos.
A ansiedade pode ser devido à complexidade ou dificuldades inerentes àquelas coisas que consideramos serem nossas obrigações. Com uma justa dose de razão, ficamos com medo de não conseguir realizá-las ou de realizá-las imperfeitamente. Outras vezes, acontece de a ansiedade ser devido não a razões vindas daquilo que fazemos, mas de nós mesmos, de nossa insegurança e falta de confiança.

Para superação dessa insegurança ajuda muito fazermos uma boa administração do tempo, que deve ser precedida por um dedicado planejamento. Para realizar esse planejamento é preciso dar-se um tempo, uma parada no corre-corre da vida e do dia-a-dia, avaliar o que vem sendo feito, priorizar o que é realmente importante, destinando o tempo necessário para cada coisa e, principalmente, ter coragem de abandonar tudo aquilo que for considerado superado e improdutivo.

Se algum êxito conseguirmos no sentido de bem planejar e organizar o tempo, criamos um outro círculo vicioso (virtuoso) que, ao contrário do anterior, faz com que a situação melhore, a auto-confiança seja reforçada e a insegurança diminuída.

A ansiedade pode ter mais de uma causa. A boa administração do tempo é um fator que certamente contribuirá, por sua influência benéfica, para a descoberta de outros conflitos que possam estar causando a ansiedade.

Fim de ano é tempo de avaliar a vida. Boa oportunidade de retomá-la e orientando-a para as direções que melhor atendem aos nossos objetivos.

Por José Morelli

quinta-feira, 5 de abril de 2012

"Quebrar arestas"

As corredeiras dos rios fazem com que lascas de pedras se desprendam, carregando-as consigo. Na medida em que estas se chocam umas com as outras e com os obstáculos encontrados nas margens e nos leitos profundos ou rasos dos rios, vão pouco a pouco quebrando suas arestas, arredondando-se em suas formas. Antes de as quebrarem, essas pedras são levadas pela correnteza com mais dificuldade e lentidão, por causa do maior atrito provocado por suas superfícies irregulares e pontiagudas. O arredondamento faz com que as mesmas ganhem mais leveza e velocidade. Estas são as contrapartidas pela perda das arestas.

A expressão “ quebrar arestas” também se aplica aos relacionamentos interpessoais. A vida humana pode ser comparada a um rio que leva. Quanto mais intenso é o relacionamento entre duas pessoas, maiores são as oportunidades destas se colidirem e de se quebrarem em suas próprias arestas, consideradas como defesas indevidas ou desnecessárias. A amizade, o namoro, o casamento, o relacionamento entre pais e filhos, entre irmãos, entre professores e alunos, entre colegas de escola ou trabalho, todos os relacionamentos inevitavelmente provocam tensões (atritos). Superfícies que se apresentem com maior dureza, podem resistir mais às colisões e permanecerem por mais tempo sem sofrerem alterações em suas formas. Deste modo, não se arredondam e continuam a atritar com as outras superfícies com a mesma morosidade. Com isso, não conseguem fluir como as outras, com a mesma leveza e rapidez.

As arestas não permitem muitas aproximações entre as pedras. Ao se chocarem, elas imediatamente se afastam umas das outras. São como espinhos que ferem e impedem de se encontrarem em suas partes mais essenciais.

Homens e mulheres possuem arestas. Diferenças e semelhanças podem ser entendidas como ameaças à integridade física e moral por ambos. Dependendo de como essas diferenças são passadas de um para o outro, a compreensão das mesmas pode receber conotação construtiva ou destrutiva, transformando-se em arestas.

O rio e a vida levam. As pedras são carregadas juntamente com as águas rumo ao mar. Na aventura de se viver humanamente, quem sabe perder, permitindo-se quebrar as próprias arestas, não perde verdadeiramente. Consegue entender que, perdendo aprimora-se, o que implica em ganhos maiores, como: maior intimidade e profundidade com os pares, maior leveza e rapidez para chegar ao objetivo.

Por José Morelli

quinta-feira, 29 de março de 2012

Temperamentos

Esta palavra vem de tempero, condimento que dá sabor diferente aos alimentos. Somos gente, pessoas humanas. Neste aspecto não nos diferenciamos uns dos outros, sejamos do sexo masculino ou feminino. Porém, à semelhança dos pratos culinários, trazemos em nossa maneira de ser uma espécie de tempero que influencia em nossa singularidade, em nossas formas concretas de agir e de reagir.

Sabores doces, amargos ou azedos. Cada um de nós tem o seu tempero ou temperamento como uma característica predominante que nos influencia, uma tendência que nos distingue e marca, o que não deve se constituir como problema; pelo contrário, deve tornar-nos mais variados uns perante aos outros, fazendo com que a vida nos seja menos monótona e enfadonha.

Sangüíneos, fleumáticos, longilíneos, brevilíneos. Estes são alguns dos tipos de temperamentos conhecidos desde há muitos anos e capazes de identificar as características mais marcantes de cada um nós.

De tipo sangüíneo são aquelas pessoas que são fortemente tomadas pela emoção em qualquer circunstância. Não escondem o que estão sentindo. Podem até ficar vermelhas com relativa facilidade. O temperamento pode determinar também o tipo físico de um indivíduo.

Os fleumáticos são o oposto dos sanguíneos. Não apresentam reações emocionais de imediato. Contam até dez antes de tomarem uma atitude, têm a capacidade de pensar antes de esboçarem qualquer reação. Os ingleses são vistos como tipos fleumáticos característicos.

Longilíneos são aqueles indivíduos que, tendo um tipo físico alto e magro, se apresentam mais como introvertidos em suas maneiras de agir, são menos expansivos não dando demonstrações de grande entusiasmo ou alegria. São contidos. Há alguns que desenvolvem boa capacidade poética, no intuito de poderem dar vazão às suas emoções.

Quanto aos brevilíneos, são aqueles que, muitas vezes, apresentam uma constituição física gorda e baixa. São expansivos, bonachões, alegres e divertidos. Entusiasmam-se com facilidade, mas também desanimam diante das primeiras dificuldades.

De certo inglês, conta-se que, viajando em um trem, fumava tranquilamente seu cachimbo. À sua frente, uma senhora que trazia um cachorrinho no colo, sentia-se incomodada com a fumaça que vinha das baforadas que o homem dava de tempo em tempo. Num dado momento, não suportando mais o desrespeito e sem cerimônia do cidadão, a senhora tirou-lhe o cachimbo da boca e o jogou para fora do trem, pela janela. O homem não esboçou nenhuma reação. Passado algum tempo, porém, ele pegou o cachorrinho do colo da senhora e disse-lhe: “Vai pegar o meu cachimbo!” e jogou-o pela mesma janela, para fora do trem.

Por José Morelli

sexta-feira, 23 de março de 2012

"Dar-se um tiro no pé"

Por absurdo que possa parecer, alguma parcela de verdade revela esta conhecida expressão da língua portuguesa. Claro que o seu significado se aplica menos em sentido literal, do que em sentido figurado. Poucos seriam aqueles que teriam coragem de disparar um tiro de revólver sobre o próprio pé, É mais fácil acontecer de darem-se outros tipos de tiros, atitudes negativas capazes de detonar chances de sucesso ou êxito.

Porque o pé e não a mão ou qualquer outra parte do corpo? Acredito que seja em função de o pé, ou os pés serem os responsáveis pelo caminhar, pelo ir para frente e são as partes do corpo que levam as pessoas aos lugares em que elas conscientemente querem ou que, por alguma razão oculta, inconscientemente, não querem. Dar-se um tiro no pé é o mesmo que impedir-se de chegar aos lugares, é roubar-se a oportunidade que a vida ou o esforço já despendido proporcionam.

Cada pessoa funciona do seu jeito. O mesmo se pode dizer das instituições e entidades em geral. Neste caso, o comportamento é coletivo e não individual. Pessoas e grupos podem funcionar a favor de si mesmos ou contra aquilo que lhes é favorável.

Um sentido crítico muito exigente pode levar a dúvidas. Quem pensa demais para se casar encontra razões a favor e contra ao casamento. Colocando-as em cima da balança, os pratos desta podem não pender nem para um lado nem para o outro, ficando em equilíbrio. As atitudes que emergem do inconsciente podem permitir que razões ocultas venham à tona.

Os negócios das empresas visam o seu próprio crescimento. Esse crescimento implica em conquistas de posições de liderança e responsabilidades. Uma ascensão social pode assustar, parecendo exigir mais condições do que seus proprietários julgam possuir. Um sócio não é igual ao outro. Enquanto um age positivamente outro pode agir ao contrário, dando-se a si e à empresa um tiro no pé. Dentre aqueles que são filiados a uma instituição seja ela qual for também pode acontecer da mesma forma. Enquanto grande parte deles age na mão certa, outros agem na contra mão do que a instituição se propõe em seus objetivos.

Desde que condicionado à matéria, nenhum posicionamento é absoluto em sua importância. Filtrada pela mente, a realidade, no tempo e no espaço, possui um dimensionamento relativo. É esta a chave que abre o entendimento de atitudes absurdas que se assemelham ou igualam àquelas de se dar um tipo de tiro no próprio pé.

Por José Morelli

quarta-feira, 14 de março de 2012

Chão

Dos estudos da antropologia, aprende-se que os antepassados do homem deixaram de viver sobre árvores e passaram a viver no chão. A partir daí, o macaco-homem foi, gradativamente, perdendo sua habilidade de agarrar-se e de dar impulsos com os braços e com as mãos e passando a desenvolver suas pernas, ganhando mais habilidade de se locomover pisando o solo terreno.

Com o aprendizado de lascar a pedra e a descoberta do fogo, sua vida se tornou mais segura, frente aos outros animais, que o tinham como presa fácil de ser capturada e devorada. Desalojando ursos e outros bichos de suas cavernas, passou a morar nelas, transformando-as em sua nova habitação e lugar onde seus filhotes e fêmeas podiam permaner, dia e noite, melhor protegidos do frio, da chuva e de outras agressões da natureza.

Depois vieram as casas construídas de pedra ou de madeira e recorbertas de palha. Com tudo isso, o chão foi se constituindo como o lugar ideal para o homem, lugar onde ele se sentia o dono do pedaço, seguro de que dali ninguém o tiraria.

O tempo foi passando... a raça humana foi evoluindo em seus pensamentos e nos meios de preservar-se. Assim, o número de humanos foi aumentando, crescendo em largas proporções. Aldeias foram se transformando em cidades. Casas térreas foram ganhando mais andares. Técnicas e arte se aliaram para a edificação de grandes castelos, igrejas, torres... O homem conseguiu desenvolver uma grande capacidade de planejar e fabricar muitas coisas, para o seu bem estar e conforto, criando inventos que fizeram crescer o domínio do homem sobre a terra, o ar e as profundezas dos oceanos. Por outro lado, com esta sua mesma capacidade, o homem desenvolveu também armas e outros meios de destruição.

Os maiores predadores dos humanos passaram a ser os próprios humanos. Em sua mente e em seu sentimento o chão voltou a ser percebido e sentido como perigoso e inseguro da mesma forma como o foi para os primatas do homem. Nas mentes e nos corações passaram a se desenvolver duas culturas antagônicas: a da paz e a da violência. Ambas se desenvolvem mediante o aprendizado.

As crianças são sensíveis a uma ou a outra dessas duas culturas. Talvez seja em função de todo esse histórico que, nos desenhos infantis, algumas crianças venham preferindo fazer as figuras voando, soltas no ar, sem que o chão lhes sirvam como base, uma forma de retornarem à segurança do alto das árvores.

Por José Morelli

sexta-feira, 2 de março de 2012

Fio da meada

Achar o “fio da meada” é uma expressão de nossa língua. Vi, no dicionário, que “meada” significa “porção de fios dobrados, emaranhados”. Quem já passou pela experiência de desmanchar um emaranhado de fios, sentiu a importância de encontrar a ponta para que o serviço fique mais fácil de ser realizado. Desde que a tenha encontrado, não que o trabalho deixe de exigir esforço e paciência, mas passa a render e a ter uma razão de continuidade com melhor definição de seu príncipio, meio e fim. Desmanchar um emaranhado de fios é um processo a ser realizado em etapas. Respeitar a seqüência natural dessas etapas, contendo-se na própria ansiedade, é um fator indispensável para que a tarefa seja realizada bem e com rapidez. “É preciso ter paciência!...” costumam dizer algumas pessoas. Em casos como esse, “a pressa é inimiga da perfeição”, dizem outras. A pressa, a falta de paciência dificultam os indivíduos de entrarem em contato com aquilo que estão fazendo. A sintonia do olhar com o objeto, a boa coordenação dos movimentos das mãos,... essas e outras condições deixam de existir, quando falta controle emocional.

Um emaranhado de fios pode muito bem servir de comparação para muitas situações da vida, no dia-a-dia. Embora nenhuma comparação seja perfeita, o uso delas pode ajudar, tanto na expressão das ideias, através da linguagem, como no exercício dos próprios desempenhos - (“performances”), em atitudes concretas, que envolvam o corpo, forçando-o a mobilizar-se e a mexer-se.

Pensando no que foi visto até aqui, talvez se possa dizer que o corpo é a ponta do fio da meada. Encontrando-o, fica mais fácil “desenrolar” o problema, no que ele tem de mais profundo, de mais enrolado. Neste caso, as partes do corpo, envolvidas, poderiam ser entendidas como “terminais”, assim como os dos computadores, ligados às centrais de informações e de dados.

A profundidade ou complexidade da vida humana, no entanto, não pode resumir-se a noções mecanicistas. Embora certas idéias e metodologias possam ajudar na solução de problemas de ordem psicológica, não conseguem esgotar o que é necessário, para o desvendamento mais completo de suas causas. Na mão dupla dos caminhos, o sentido oposto, repesentado pelo inconsciente e seus meandros, completam os recursos disponíveis, num imenso arsenal, dinâmico e incomensurável, à disposição dos profissionais, que se dedicam a esse estudo e a essa busca de solução de problemas humanos.

Por José Morelli

quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

A força da fraqueza

Não é só a força que é forte, a fraqueza pode, também, ser forte e como!... Olhando para o que acontece à volta e para a própria vida, pode-se observar a verdadeira dimensão da fraqueza como impulsionadora de muitas ações: um mal-estar, uma tontura, um choro, uma “cara com bico”, uma chantagem emocional e outras “fraquezas” são capazes de mobilizar grandes esforços.

A fraqueza sensibiliza. A criança logo percebe como conseguir aquilo que quer, através da manifestação de sua dependência e impotência. A necessidade de mostrar-se forte, por parte dos pais e dos adultos em geral, faz com que estes não queiram decepcionar, respondendo e correspondendo às demandas das crianças.

Se, no lugar de apostar na própria fraqueza, investindo em manifestações de incapacidades, os adultos principalmente avaliassem o quanto de força se esconde em muitas de suas fraquezas, certamente abandonariam essa estratégia de apostar tantas fichas nelas, dando-se a chance de se descobrirem como pessoas mais capazes e menos comodistas.

Algumas pessoas conseguem ser exemplo desse tipo de atitude positiva. Dentre os portadores de deficiências, percebe-se cada vez mais que não querem nem se sentirem incapazes, nem que os outros os vejam dessa forma.

Procuram se superar, desenvolvendo ao máximo o que conseguem de suas potencialidades. Transformam a própria fraqueza em estímulo de força para se superarem. Transferem a energia que seria despendida pelos membros deficientes para aqueles que são mais saudáveis, desenvolvendo-os e aprimorando-os em suas capacidades.

O professor Milton Santos, já falecido, quando de sua participação no programa “Roda Viva”, na TV-Cultura, chamou a atenção para um fato, que considerava motivo e razão de esperança para os brasileiros e para o Brasil. Tratava-se do predomínio da população jovem, comparado ao da população adulta, e da condição de pobreza material em que vive grande parte destes jovens (fraqueza?). Dizia ele que era exatamente nisso que residia o maior estímulo deles buscarem superar as más condições em que se encontravam, desde que lhes fossem dadas oportunidades. A mentalidade de não se fazer de coitado, mas de acreditar em si, é o que faz mudar a vida das pessoas e do país.

Toda proposição precisa ser vista com bom senso. A proposição, contida nesta coluna, não foge à esta regra. De maneira equilibrada, sugiro ao amigo leitor/a, que avalie as fraquezas que envolvem a própria vida e veja se e como a força se faz presente em suas “fraquezas”.

Por José Morelli

quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

Asas à imaginação

Os seres humanos não possuem asas como as aves e as borboletas; mas, nem por isso seus pensamentos deixam de proceder como se as tivessem. Com elas, a capacidade imaginativa do homem é capaz de voar como os pássaros que, em bando, cruzam velozmente o céu indo ao chão, a um telhado, escondendo-se entre as folhas verdes de uma árvore qualquer ou como borboletas que, num piscar de olhos, passam de flor em flor.

O destino humano não poderia se prender apenas a ciscar o chão como as galinhas. Santos Dumont perseguiu seu sonho de voar até conseguir realizá-lo. A insatisfação serviu-lhe como estímulo à sua criatividade e inventividade. Por não ser completo, o ser humano tende sempre a buscar mais, a superar-se. Esta tem sido a força motriz do progresso, caminho irreversível trilhado pela humanidade, em todas as áreas do conhecimento.

Os desafios que se apresentam todos os dias precisam de muita imaginação para que possam ser superados. A valorização da capacidade de imaginar, de dar asas ao pensamento, num sentido construtivo, é imprescindível nos dias de hoje, tão cheios de impasses frente aos graves problemas que indivíduos e sociedade enfrentam.

Da imaginação é preciso se passar à ação. Da liberdade é preciso se passar à realidade. O direito de um termina quando se confronta com o direito de outro. Até os pássaros possuem um sistema de controle ao qual cada um deles responde imediatamente. Em seus vôos, eles se mantêm eqüidistantes uns dos outros, ao fazerem curvas e ao controlarem a própria velocidade.

Com os cidadãos e cidadãs acontece de maneira semelhante. Quanto maiores os avanços, mais complexas e exigentes serão as relações humanas. Com a imaginação, dotada de potentes asas, indivíduo e sociedade podem expandir seus repertórios de respostas, a fim de atenderem às demandas de cada novo momento.

Por José Morelli